Leia a entrevista de Pedro Bottino, do Todos pela Educação, com a coordenadora do Movimento Voto Consciente, Celina Marrone.
A Educação política vai além de entender o processo democrático, conhecer as atribuições dos representantes eleitos e acompanhar suas ações. Para Celina Marrone, coordenadora do Movimento Voto Consciente, Educação política é, sobretudo, uma forma de o cidadão garantir sua liberdade de escolha. “A liberdade está ligada ao conhecimento, à capacidade de interpretar e de avaliar”, afirma.
Em entrevista por ao Todos Pela Educação, Celina explicou como se comporta o eleitorado brasileiro, comentou a importância da formação política nas escolas e apontou caminhos para a consolidação do processo de participação política.
O Voto Consciente é uma entidade da sociedade civil apartidária e formada por voluntários. Desde 1987, desenvolve ações educativas em comunidades e acompanha o desempenho de vereadores e deputados nas Câmaras Municipais e na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo. Veja a íntegra da entrevista:
Todos Pela Educação: A principal bandeira do Movimento Voto Consciente é a Educação política. O que é Educação política e como ela pode melhorar a vida das pessoas?
Celina Marrone: A Educação política tem vários aspectos, mas o principal é a informação. Alguém que não tem informação não pode ter critério de avaliação. Nós pedimos que as pessoas votem com consciência, e ter consciência significa ter ciência, ter saber, conhecer. Pensando nisso, começamos uma grande batalha para informar em todos os níveis de capacidade intelectual e de formação cultural. Dessa forma, o eleitorado que tem pouca informação pode entender perfeitamente o processo político e fazer suas escolhas.
Todos Pela Educação: No Brasil, é comum ouvir as pessoas dizerem que não gostam de política. Qual é o efeito disso no processo eleitoral e na democracia de um país?
Celina Marrone: As pessoas não definem muito bem o que é isso. Dizer que não gosta de política, nesse caso, é dizer que não gosta das coisas como estão. As pessoas não gostam da política que está aí, sendo feita pelos políticos que elas votaram e pela qual elas são responsáveis diretas. Meio responsáveis, eu diria, porque sem informação elas não são responsáveis. Essa consciência é que levamos às pessoas.
Todos Pela Educação: A senhora nota um desejo de participação política nas pessoas?
Celina Marrone: Tenho certeza que há. Caminho pelos bairros mais humildes e vejo que, quando as pessoas abrem o coração, são realmente tocadas pela política. É um absurdo que, até hoje, não se tenha percebido que é preciso uma formação política nas escolas. Não uma formação de política partidária, mas que explique como funciona a nossa democracia, o que é esse sistema e quais são as obrigações daqueles que escolhemos para governar. É simples.
Todos Pela Educação: O eleitor brasileiro ainda vende seu voto?
Celina Marrone: A população não vota em quem sabe que é corrupto. O eleitor já percebeu que não vale a pena votar em candidato que distribui R$ 100 por cabeça, porque a garantia das necessidades básicas é bem mais cara do que o benefício recebido. Um voto comprado não é só um voto perdido, mas uma desgraça na vida de quem vende.
Todos Pela Educação: Então, já foi superado o tempo em que as pessoas aceitavam que um governante roubasse se tivesse realizações?
Celina Marrone: Superado, não. O Brasil é muito grande. Nas eleições municipais, principalmente nas cidades pequenas, o trabalho de Educação política prospera rapidamente. Mas em um país enorme como o nosso ainda existem muitos com essa mentalidade.
Todos Pela Educação: O que é mais importante saber sobre os candidatos antes das eleições?
Celina Marrone: Na hora de escolher o candidato, o eleitor deve observar o partido. É importante saber, por exemplo, se o partido tem muita gente com a “ficha suja”. O Ficha Limpa foi importante para isso, mas não está tudo peneirado. Além disso, os condenados estão recorrendo e, enquanto eles puderem recorrer, mesmo que sejam criminosos, não podem ser excluídos da corrida eleitoral. O povo precisa ficar esperto: tem muita gente que já foi condenada fazendo propaganda eleitoral.
Todos Pela Educação: Onde o eleitor pode se informar sobre isso?
Celina Marrone: Há o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), ao qual o Movimento Voto Consciente é irmanado. No site do movimento, existem muitos artigos sobre isso. O Voto Consciente também lançou um site chamado Ficha Pública.
Todos Pela Educação: O que um candidato não pode prometer antes das eleições?
Celina Marrone: O candidato que é eleito para legislar e fiscalizar não pode prometer que vai gastar dinheiro, que vai construir. O que ele pode fazer é autorizar ou não. Os "fazedores" são os executivos, mas esses precisam ser autorizados. Nem o presidente da República pode fazer alguma coisa se não for autorizado. Essa noção começa a ficar no inconsciente do eleitor e o ajuda a direcionar suas escolhas. Muitos não se lembram em quem votaram nas últimas eleições
porque não escolhem, ouvem palpite. E aí é como palpite de qual cavalo que vai ganhar a corrida.
Todos Pela Educação: A senhora acha que as eleições no Brasil são personalistas?
Celina Marrone: Hoje em dia, os partidos realmente não têm programa de governo. Vemos por esses tais "puxadores de voto". O que os partidos querem é que esses candidatos tenham uma baciada de votos, para que eles ajudem a eleger os de sempre. Esses são os que têm muito dinheiro de campanha e que têm dono. Eu digo sempre para as pessoas nas palestras do Movimento: “Preste atenção, porque se o candidato tem dinheiro de mais, tem dono. Veja quem é o dono dele, pode ser um dono bom ou um dono ruim”. É por isso que a reforma política é urgente. Acho que a lista fechada seria uma enorme vitória. Precisamos criar uma cultura de filiação partidária e de participação das pessoas na construção dos programas dos partidos.
Todos Pela Educação: É possível garantir participação política depois das eleições?
Celina Marrone: O trabalho que estamos fazendo tem de continuar. Acho, então, que vamos formar o cidadão não só para que ele vote com consciência, mas para que também opine no levantamento de necessidades dos bairros, que passe a cobrar soluções dos secretários, que exija dos prefeitos que façam audiências públicas verdadeiras. Esse é um mecanismo que traz à população uma consciência. Aí, o povo começa realmente a ter voz e a participação política começa a ser legítima. No fim, o que os candidatos querem é voto. E se o povo tem voz, os políticos começam a obedecer ao povo. É claro que isso é um processo que não acontece do dia pra noite e que, de vez em quando, dá um pouco de aflição porque o Brasil é muito grande. Mas não dá para desesperar.
Todos Pela Educação: A Educação formal pode ajudar o eleitor a votar melhor? Eleitores mais escolarizados tendem a votar com mais consciência?
Celina Marrone: A Educação desaperta a consciência. Mas eu não diria que o nível de Educação formal, que depende de fatores sociais e econômicos, esteja relacionado a esta consciência. Pelo contrário, pessoas que têm um nível econômico-social elevado podem ser displicentes e não se incomodar com políticas públicas de base. Isso afeta mais os pobres, que realmente precisam de atendimento. Agora, o que eu tenho certeza é que a Educação é necessária de qualquer forma. Se a pessoa é semialfabetizada, não consegue ler uma notícia, tem de perguntar para alguém, tem de confiar em alguém e, então, já não é livre. A liberdade de escolha está ligada ao conhecimento, não à alta escolaridade. À capacidade de interpretar e de avaliar.
Fonte: Todos pela Educação
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário