Naquele mesmo ano nascia o Idade Mídia, em vigor até hoje, sob a coordenação de Alexandre, que resolveu colocar no papel a trajetória desse projeto onde o jovem é sujeito e narrador de sua história, sua aprendizagem. Arquiteto de seu conhecimento!
Muita gente tem vontade de criar um projeto, mas não sabe como começar, desanima-se porque não sabe o que vai enfrentar ou tem medo de como será o processo. Talvez o livro "Idade Mídia - A Comunicação Reinventada na Escola", de Alexandre Le Voci Sayad, publicado pela Aleph Editora e já nas livrarias do país, possa ser um estímulo, porque mostra um caminho, um processo, erros e acertos, além de depoimentos de pessoas envolvidas com o projeto. Mostra de que maneira o Idade Mídia "tocou" cada um dos alunos e fez diferença em suas vidas.
Pra contar um pouco do livro e do projeto, conversamos com Alexandre, que é jornalista, educomunicador, coordenador do Idade Mídia, secretário executivo da REDE CEP (Rede de Comunicação Educação e Participação) e mais um monte de outros cargos, voluntários ou não, que envolvem o ideal da comunicação voltada para o desenvolvimento. Boa leitura! (Cristiane Parente)
Alexandre Le Voci Sayad |
Alexandre Le Voci Sayad - Dez anos foram suficientes para criar não só um projeto que envolve comunicação, mas um modelo de educação que procura dialogar com o jovem e as grandes questões que cercam o aprendizado hoje. É tempo suficiente para se medir eficiência e o impacto da aprendizagem nos alunos. Resolvi contar tudo isso num livro e num blog para inspirar outras belas histórias.
Cristiane Parente - Como você definiria o Idade Mídia?
Alexandre Le Voci Sayad - Um programa que abre canais para que o estudante seja o ator de seu aprendizado, se expresse e esteja apto a desenvolver projetos com sucesso, além de acreditar na sua capacidade de realização.
Cristiane Parente - De que maneira você acha que ele pode contribuir para que educadores sintam-se estimulados a trabalhar com mídia nas escolas numa perspectiva emancipadora?
Alexandre Le Voci Sayad - Os projetos em comunicação (e aqui eu incluo também as artes numa perspectiva mais ampla) são a única maneira de realizar uma educação que interesse ao jovem em plena época em que os meio estão cada vez mais baratos e difundidos.
É parte da realidade da vida dos estudantes, Por que não trazê-la para dentro do ambiente de aprendizado? É uma chance de ouro para reposicionar a escola como espaço importante de aprendizado, e assim torná-la relevante ao estudante. Isso se traduz, em médio prazo, na redução da evasão escolar.
CP - O livro não é uma produção individual sua. Há colaborações de Daniela Moreira, Fernando Rossetti, Ismar de Oliveira Soares, Marina Consolmagno, Sérgio Rizzo e Sylvio Ayala. Que relação essas pessoas possuem com o projeto Idade Mídia?
ALVS - Sou uma espécie de facilitador, ou complicador, no processo de aprendizagem no Idade Mídia. Mais um maestro do curso do que um músico da orquestra. O programa tem como princípio expandir o tempo e o espaço escolar e, justamente por isso, conto com a colaboração de diversos atores de fora do ambiente escolar para arejar e dinamizar o curso. Esses colaboradores do livro estão entre os mais de trinta que, de alguma maneira, contribuíram com o Idade Mídia nesses dez anos. Vão do Marcelo Tas, passando pela Sarah Oliveira, Sérgio Rizzo e Ismar Soares.
CP – Qual foi a principal dificuldade de implementação do Idade Mídia naquela época, há dez anos e qual dificuldade você vê hoje, se um educador resolvesse criar um projeto como o Idade Mídia? Está mais fácil? Mais difícil?
ALVS - Quando surgiu em 2002, a internet ainda não era esse fenômeno de mudança paradigmática social que é hoje. Não havia redes sociais. O Idade Mídia foi uma aposta ousada. Muita gente, e aqui eu incluo muitos professores, não entendiam a realidade próxima de uma era em que a informação seria commodit – em que o aluno muito possivelmente poderia estar mais bem informado que o professor sobre determinado assunto. Fui muitas vezes mal compreendido ou mesmo tratado como um lunático quando já falava sobre esse tema – na verdade já falava em palestras sobre a necessidade de uma mudança nos modelos educativos desde o ano de 1999.
Hoje esse discurso é praxe – há mais elementos no cotidiano que o fazem ser mais facilmente entendido. Em projetos como o Idade Mídia, ninguém sai perdendo. Os professores, os alunos e a escola ganham sempre. Quando isso passa a ser enxergado, os canais passam a se abrir.
CP - Como você, enquanto jornalista, se viu dentro da escola? Que papeis podem ser desempenhados por jornalistas ou pelos educomunicadores nos espaços educativos, especialmente agora que já temos uma licenciatura na área (USP) e um bacharelado (UFCG) e maior reconhecimento em relação ao conceito? Você se considera um educomunicador?
ALVS - Sim, me considero um educomunicador, ou melhor, um comunicador que encontrou na educação um campo fértil para a inovação. Foi difícil começar com vinte e poucos anos querendo que todos me vissem como educador no colégio mais sofisticado de São Paulo. Agora me sinto mais ambientado.
Acho que os profissionais de fora do campo da educação têm sempre muito a colaborar com ela; isso vai alem do comunicador. As universidade de pedagogia, em sua maioria, formam pesquisadores em educação (e olhe lá!) e o mercado docente não atrai os melhores profissionais.
Ou seja, eu acho que os demais profissionais que canalizarem e votarem seus talentos no sentido de melhorar os modelos de ensino serão fundamentais para uma educação de ponta - seja ela pública ou privada.
No campo da comunicação, vejo com bons olhos as licenciaturas, porque ousam misturar outras áreas à reativa “pedagogia pura” como cátedra.
CP – Que resultados você pôde ver após dez anos de Idade Mídia nos alunos que dele participaram? Tanto os resultados relacionados à questão mais didática, da escola e seus conteúdos, como resultados em termos mais pessoais e de amadurecimento dos alunos.
ALVS - Não tenho notícia de um ex-aluno que não tenha realizado algum projeto pessoal ou profissional do qual não se orgulhe. Todos construíram com autonomia o que, nas suas percepções, consideravam o sucesso. Nisso eu inclui os 30% de estudantes da periferia da cidade e os 70% que tiveram a sorte de poder estudar sem bolsa no Bandeirantes.
Esse sucesso se deve à capacidade de expressão, de escrita, de relacionamento, de construção de redes e de ousadia de tentar coisas novas e criativas. O lema do Idade Mídia sempre foi: “Ouse ser tolo”.
CP - Um projeto como o Idade Mídia pode dar certo em qualquer escola? Que princípios devem ser seguidos para que o projeto não vire uma imitação acrítica do que já é feito pela grande mídia ou vire apenas um projeto institucional da escola?
ALVS - A autonomia na gestão do projeto é um fator de sucesso do Idade Mídia que não pode ser esquecido. Tive muita independência para que os estudantes sempre fossem os condutores do processo e do produto, por parte da direção da escola. Ninguém quis ler uma única linha que seria publicada, nem fez nenhuma exigência. Essa relação de confiança é fundamental e, na minha visão, possível de ser construída em outros locais.
No livro, eu considero o Idade Mídia um projeto mãe; acho que deve inspirar outros que se baseiem em seus princípios e objetivos – na sua essência. Assim ele se torna flexível a vários ambientes – não precisa ser replicado exatamente igual. Há um direcionamento no livro, mas não uma fórmula mágica.
O processo educativo, que dura um ano, é fundamental para que os alunos pensem e criem algo autêntico e não mimetizem o Jornal Nacional. O livro detalha bem partes do processo que servem de ruptura de limites e ampliação de repertório para os estudantes. É importante que o curso apresente a possibilidade de se sonhar com o novo e de também criar estratégias para transformar esse sonho em realidade.
CP - Você acredita em projetos como o Idade Mídia como fazendo parte de uma política pública de uso dos meios nas escolas de forma crítico e criativa? O que uma política pública que pensasse uma educação para/pelos/com os meios poderiam trazer para a Educação brasileira e a formação de toda uma geração?
ALVS - Traria uma nova importância para a escola, pois colocaria o jovem no centro do aprendizado e o faria produtor de conhecimento também.
Nunca ninguém perguntou o que o estudante quer viver na escola – o que ele deseja aprender, qual a escola que ele sonha.
As políticas públicas em educação são sempre baseadas no ego dos educadores e gestores ou nas demandas da economia, mas jamais tem o estudante no centro, como ator.
Não se trata só de uma educação para/pelos/com os meios, mas sobretudo da produção da própria comunicação e intervenção do estudante no "ecossistema comunicativo" da escola com sua voz. Essa é uma maneira de fazê-lo sentir-se parte da escola e da educação - como um ator. De apropriar-se mesmo das questões da escola.
Uma educação que faça sentido para eles é fundamental para que consigam se formar com qualidade no que aprenderam.
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