Enquanto muito se fala das tecnologias aplicadas à Educação, mas será que as escolas e os professores estão realmente preparados para essa realidade? Com o acesso a milhões de informações, por meio da internet, os professores precisam adequar o discurso e melhorar a comunicação com os alunos. As vantagens e desvantagens do uso das tecnologias em sala de aula foram o assunto da entrevista, feita pela equipe do projeto Jornal Escola e Comunidade, do jornal A Tribuna (Santos/SP) ao professor Wendel Freire (foto), autor de "Ensino-aprendizagem e comunicação" - obra publicada pela WAK Editora.
A escola está preparada para acompanhar os avanços da tecnologia e da comunicação?
Não sei se nós estamos preparados para acompanhar a tecnologia. Isso exige uma dedicação quase exclusiva para acompanhar as novidades que, nem sempre, valem a pena para um educador ou uma escola. No início do século passado, saíamos das graduações prontos. Essa sensação já não existe mais. Assim, buscamos a chamada formação continuada a fim de adotar uma postura mais fluida. Mas, estamos abertos a experimentar os suportes que surgem nas prateleiras e nas mãos dos alunos de modo a estimular a criação conjunta? O que queremos com isso? Nos perguntamos sobre tais dispositivos, sobre seus usos, e estamos instigando nossos alunos a pensar sobre eles? Essas questões, e outras, podem nos ajudar a lidar com o nosso algoz contemporâneo: a velocidade. E encarar essas interrogações independe da receita de cada gestor escolar, seja da rede particular ou pública.
A “arte de ensinar” persiste nas escolas, apesar das mudanças na sociedade?
Ensinar deve ser parte de aprender, do mesmo modo que teoria e prática, na etimologia da palavra praxis, são indissociáveis. Arte exige sensibilidade, muito trabalho e pesquisa. Se pensarmos na arte de ensinar-aprender nesses termos, sem dúvida, podemos afirmar que ela está presente em muitas escolas. Principalmente, nas práticas de professores inquietos que, junto de crianças e adolescentes que dispensam formação para o uso dos multimeios, fazem algo natural, questionam o processo comunicacional. Esses educadores aprendem com os usos criados pelos seus alunos e ensinam ao desnaturalizar usos e dispositivos técnicos.
A figura do professor como parâmetro para seus alunos se encontra fragilizada diante da velocidade e diversidade de informação?
Parâmetros e modelos são questionados intuitivamente pelos jovens o tempo inteiro. Certamente, a figura do professor arrogante, dono do saber que vai generosamente levar sua “luz” aos alunos, está destroçada! Quem pensa no processo de ensino e aprendizagem unidirecional entra em forte colisão com um educando habituado à multitarefa, à multidirecionalidade. O educando é um ouvinte-espectador-leitor em um novo contexto comunicacional, onde passa a ter o poder de emissão, passa a produzir e veicular com grande facilidade e liberdade seus conteúdos. Este novo contexto, bem explorado por um professor investigador de suas práticas, pode se revelar bastante proveitoso na transformação coletiva de informação em conhecimento.
Que alternativa o professor pode adotar para estimular a leitura e oferecer conhecimentos mais aprofundados?
A pergunta me fez pensar no ensino de literatura. Preso à historiografia, ao ensino da sucessão de escolas literárias no tempo, ao ensino do que estudiosos disseram sobre as obras que eles consideram as mais significativas, não tem levado os alunos a serem melhores leitores, antes ainda, não fomentam o hábito de leitura, um dos seus principais objetivos. Não precisamos, nem devemos, abandonar isso, mas é extremamente necessário estabelecer links com o que é produzido hoje. Não só o que sai em livros, mas toda inovação que usa áudio, vídeo e fotografia, no ambiente denominado cibercultura. Afinal, a experiência das inovações narrativas do vídeo-poema, da ciberpoesia e dos contos escritos coletivamente podem despertar o interesse pelos mais diferentes tipos de texto.
Você concorda com o uso da internet como ferramenta pedagógica?
A cultura emergente na rede deve ser alvo da apropriação pedagógica, sem dúvida. Aliás, com dúvidas. O que é a “interatividade” além de uma palavra bastante desbotada pelos usos comerciais? E “hipertextualidade”? Como a noção texto se altera com o ambiente digital? Já não basta pronunciar tanto esses termos sem vê-los, de fato, no cotidiano escolar? A sala de aula pode ser enriquecida com práticas de pesquisa, interpretação e avaliação crítica de textos digitalizados.
Quais seriam os meios seriam mais adequados para serem usados em sala de aula?
A internet pode dinamizar conteúdos curriculares, mas também servir de objeto de estudo, na produção midiática, e na produção de mídias escolares, usando blog, podcasting ou postando criações audiovisuais no youtube. A metodologia do webquest e a criação de mapas conceituais podem significar bons pontapés nessa direção. Quem tiver o interesse de realizar os mapas pode recorrer a um programa, o Cmaptool, que pode ser baixado livremente.
A inclusão digital proporciona o contato com milhões de informações de todo o mundo. As pessoas estão preparadas para interagir nesse ambiente?
Lembro de um documentário chamado “Periferia.com”, realizado pela TV Cultura, que mostrava a proliferação de lan houses pelas metrópoles. As crianças e adolescentes da periferia não têm dificuldade em encontrar esses espaços e estão sim utilizando com frequência a internet. Mas seus usos limitam-se, geralmente, aos games e às redes sociais. Bastará, então, termos computadores nos ambientes para que a internet democratize os acessos ao conhecimento e à produção do conhecimento? Talvez as pessoas estejam preparadas instrumentalmente, mas não devemos nos contentar apenas com esse uso. Incluir digitalmente demandará um compromisso que as lan houses e seus empreendedores não tem como assumir, a formação de leitores, ouvintes e espectadores críticos, mas também, e principalmente, de produtivos emissores de textos diversos.
Fonte: Projeto JEC - A Tribuna/SP