O objetivo do estudo era elaborar histórias em quadrinhos sobre os distúrbios do sono mais comuns e testar o quanto elas poderiam informar corretamente as crianças. Foram considerados 548 alunos de 6 a 10 anos de escolas públicas e privadas. Em primeiro lugar, foi feito um levantamento dos prontuários médicos do Ambulatório de Neurosono da Unifesp para que fossem identificados os principais distúrbios de sono e o nível de informação que os pacientes tinham sobre as doenças. Baseado nisso, foram eleitos quatro problemas principais, que se revelaram prevalentes e/ou pouco conhecidos dos pacientes: ronco, higiene do sono (que são as medidas que levam a um sono tranquilo e saudável), apneia obstrutiva do sono e síndrome das pernas inquietas. “A partir disso, desenvolvemos personagens para as histórias. Nos preocupamos em aplicar características inerentes às crianças que têm esses distúrbios. Por exemplo, a personagem que tem apneia obstrutiva é pequena, porque essa é uma das consequências do problema, a criança não cresce como deveria”, explica a autora. Por fim, de três historinhas desenvolvidas pelo estudo, uma foi testada nos escolares.
O método consistiu em visitar as crianças nas escolas e entregar a elas um questionário com três questões relacionadas ao ronco e higiene do sono. Em seguida, os alunos leram uma história em quadrinhos sobre o tema e, na sequência, responderam novamente ao mesmo questionário. As respostas dadas antes e depois da leitura foram então comparadas, e observou-se que:
- Em relação ao hábito de tomar leite morno antes de dormir, que é uma conduta indicada para o sono saudável, 66,8% das crianças considerava que a prática é saudável antes de ler a história. Após a leitura, esse número cresceu para 84,5%.
- Quanto ao ronco, 57,9% achava, antes da leitura, que o hábito é normal e, após, apenas 37,3% fizeram essa afirmação.
- 39,6% das crianças acreditava que o ronco poderia ser um sintoma, ou seja, sinal de que algo está errado na saúde. Depois de ler a história em quadrinhos, esse percentual cresceu para 61,4%.
- Antes da leitura, 42,1% considerou que todo mundo ronca, e 23,4% disseram que roncar não é educado. Depois dela, somente 25,6% assinalou que todos roncam, e 19% considerou a prática como falta de educação.
- Não foram identificadas distinções entre gênero e condição socioeconômica no que diz respeito à compreensão do conteúdo dos quadrinhos.
“Constatou-se que houve diferença significante entre as respostas corretas, antes e depois da leitura, o que pode indicar a eficácia dessa ação de educação em saúde”, afirma Eleida.
Quadrinhos: mais eficazes que leitura?
“Na área de educação e saúde, é muito mais eficaz a comunicação que considera o público. Muito do material é desenvolvido em forma de panfletos por médicos e profissionais da área de saúde em geral, que não são comunicadores. Por isso, há um predomínio da visão do especialista sobre o repertório do paciente. No caso dos pacientes pediátricos, a história em quadrinhos tende a ter eficácia superior a uma estratégia tradicional de leitura do texto, pois ela é muito mais sedutora para este público”, argumenta Eleida, que defende a adoção deste recurso na educação infantil. “Eu indico não só o uso dos quadrinhos, mas também de outras estratégias lúdicas, como contador de histórias e brinquedos. Toda estratégia multissensorial tende a ser mais eficaz do que apenas um apelo. Os quadrinhos envolvem percepção visual e o texto em si, e, independente do tema que tratam, essa relação de imagem e texto ajuda muito na compreensão do conteúdo e estimula a criança a ler mais”, discorre.
Segundo a especialista, apesar da pouca pesquisa na área, a importância das histórias em quadrinhos no aprendizado infantil já é bastante reconhecida pelo poder público. Ela diz que há anos existe um incentivo do Governo Federal para que se aumente o acervo de histórias em quadrinhos em bibliotecas públicas, bem como um reconhecimento dos próprios professores, que usam a técnica em sala de aula.
Mais sobre os distúrbios do sono
A pesquisadora enfatiza que é importante conhecer os sinais dos distúrbios para que o diagnóstico seja feito de modo rápido e preciso. “A apneia obstrutiva é considerada um distúrbio do sono grave e traz muitas consequências, especialmente para a criança. Se isso persiste, essas deformidades são irreversíveis. O tratamento na fase adulta, muitas vezes, só pode ser cirúrgico”, alerta a especialista, advertindo que a operação é de grandes proporções, uma vez que interfere diretamente na ossatura da boca. “É fundamental ampliar as possibilidades de tratamentos menos invasivos e mais eficazes, principalmente na fase escolar, entre os 6 e 10 anos de idade”, diz Eleida, referindo-se também aos tratamentos medicamentosos.
Higiene do sono: as indicações para se ter um sono saudável incluem não fazer exercícios físicos ou ingerir cafeína (presente no café, chá, chocolate, guaraná, entre outros) por, pelo menos, duas horas antes de dormir, não comer muito antes do sono, beber leite morno (sem chocolate) antes de ir para a cama e diminuir a luminosidade do quarto.
Apneia obstrutiva: são pequenas paradas respiratórias que acontecem durante toda a noite sem que a pessoa perceba. Dentre os prejuízos estão irritabilidade pela manhã, no caso das crianças, e sonolência, no caso dos adultos, dificuldade de memorização, déficit cognitivo e consequente piora no aproveitamento escolar, crescimento não adequado, uma vez que o hormônio do crescimento não é liberado plenamente quando não se chega ao estado de sono profundo, e deformidades craniofaciais, que trazem prejuízos fonoaudiólogos e ortodônticos.
Síndrome das pernas inquietas: é a necessidade de movimentar as pernas causada por uma sensação de formigamento, agulhada ou dor incômoda no momento de repouso. Nos adultos, é mais comum na hora de dormir, o que obriga o paciente a levantar e fazer caminhadas até que a dor passe (por isso, pode ser confundida com insônia). Nas crianças, geralmente se manifesta pela manhã, e, no caso do aluno que estuda neste horário, não raro é confundida com hiperatividade, uma vez que ele não consegue ficar sentada durante a aula.
O problema pode ser hereditário ou estar ligado à falta de ferro no sangue – tanto que é comum nas mulheres grávidas e em período menstrual, situações em que há uma redução deste componente no organismo. Justamente por ser frequentemente confundida com outros problemas, a condição tem de ser investigada junto a um especialista para que o tratamento seja adequado.
Texto originalmente publicado em: http://bebe.bolsademulher.com/destaque/materia/pesquisa-mostra-importancia-de-hqs-no-aprendizado-infantil/
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