Na semana
em que comemora-se o Dia Internacional da Mulher apresentamos a história de um
exemplo feminino, Denise Bondan,
autora do livro “Anjo Desgarrado – bastidores de uma
vida abençoada”. Uma história de amor que fala de um “anjo” de
nome Leonardo. Um menino que nasceu com encefalopatia, a qual os médicos
denominaram como um retardo mental com autismo.
A motivação em escrever o livro
surgiu primeiramente após um grave acidente doméstico, que lesionou para sempre
o olho esquerdo de Leonardo, além de um somatório de experiências surreais
vividas ao longo de 28 anos ao lado dele.
Da expectativa do nascimento à
conturbada e dramática descoberta da neuropatia do filho, dos seus primeiros
passos à descoberta do peculiar autismo, a autora convida o leitor a vivenciar
histórias deliciosamente cômicas, bem como dramáticas da vida dela, procurando
alinhavar o relato sempre pela ótica do humor e das lentes do otimismo.
O leitor é guiado por entre flores e pedras, num passeio intenso e desafiador, isento, no entanto, de cores dramáticas e de sentimentalismo. Enquanto ela repensa, neste trajeto, na própria existência e o quanto o amor é fundamental para superar obstáculos e colorir a vida.
Apressado em voltar para a “casa de cima” (como assim Denise denomina o céu), Leonardo partiu deixando para a mãe a missão de divulgar o livro “Anjo Desgarrado”. Contando a sua história e a história de amor de sua família.
O leitor é guiado por entre flores e pedras, num passeio intenso e desafiador, isento, no entanto, de cores dramáticas e de sentimentalismo. Enquanto ela repensa, neste trajeto, na própria existência e o quanto o amor é fundamental para superar obstáculos e colorir a vida.
Apressado em voltar para a “casa de cima” (como assim Denise denomina o céu), Leonardo partiu deixando para a mãe a missão de divulgar o livro “Anjo Desgarrado”. Contando a sua história e a história de amor de sua família.
O DIÁRIO NA ESCOLA: Como você percebeu que Leonardo era diferente
das outras crianças da mesma idade?
DENISE: Comecei a ficar
ensimesmada com os atrasos nas ditas fases que o bebê deve cumprir, reportadas
pelo famoso livro de um aclamado e reconhecido médico, o manual de todas as
mães de filhos. Leonardo não sentava, não sustentava a cabeça no tempo certo,
não começou a caminhar ou a falar segundo ditava a “normalidade” da bíblia dos
bebês. Alguns comentários de pessoas próximas só aumentavam a desconfiança que
já estava plantada dentro de mim: “Nossa, que criança boazinha! Nunca mais vais
ter um filho assim!”, ou “Como ele se distrai sozinho…”. “Ele ainda não anda?
Nem fala nada?”. Os pediatras não detectaram ou alertaram nada. Até que um
deles disparou em mim o alarme que faltava, ao dizer “mãe, se Leonardo não
andar até um ano e meio vou encaminhá-lo para um neurologista”. Concretizou-se
o meu medo. Começava assim a longa jornada que duraria sua vida toda.
No livro você conta que a doença do seu filho não chegou a ter um
único e definitivo diagnóstico. Qual era a dificuldade encontrada pelos
médicos?
Leonardo primeiramente foi
enquadrado como portador de uma variante da Síndrome de Lennox-Gastaut, por
muitos anos. Depois taxado de autista com quadro de retardo mental severo. E
finalmente, o que achamos mais sensato e próximo da sua realidade,
diagnosticado como tendo uma encefalopatia qualquer (de padrão indeterminado)
associada ao evidente retardo.
Mesmo sem saber exatamente a doença que Leonardo teve, que
tratamentos médicos ele recebia?
Leo começou uma tardia
estimulação precoce, por conta da demora em detectar-se seu atraso mental e
motor. A beleza física de Leo sempre conferiu-lhe uma ar saudável. Nosso bebê
dourado, no entanto, não se encaixava nos padrões da bem-aventurada
“normalidade” apregoada por nossa sociedade. A partir da descoberta da sua
encefalopatia começou a ser submetido a sessões de fono, fisioterapia, terapia
ocupacional e, posteriormente, à sensacional equoterapia. E assim caminhou
nesta necessária “via-sacra” por muitos anos, e progredia lentamente a cada
estação.
Como foi a sua experiência de viver aqui, na Cidade Canção?
Quando chegamos à Maringá
encantou-me sobremaneira a arborização da cidade. Preterimos Londrina porque
foi paixão à primeira vista. Mas não posso dizer que foi um tempo fácil, pois
foram dois anos e dois meses de muita solidão. Acabara de casar e de cortar o
cordão umbilical que me atava aos meus pais. Meu marido viajava a semana toda e
eu, ainda sem filhos, sentia dificuldade de socialização com a população
flutuante de uma cidade jovem de apenas 33 anos na época. Para grande
felicidade, porém, nutridos pelo forte sentimento de formar uma família,
geramos nosso primogênito Leo, embalados pela beleza inspiradora da Cidade
Canção.
A fase escolar do seu filho foi vivenciada em escolas especiais.
Conte para nossos leitores um pouco dessa experiência.
As escolas fizeram de Leo um ser
mais pleno. Desenvolveram e ampliaram seu potencial humano. Adquiriu
habilidades como começar a comer sozinho, beber com copo sem ser de canudinho,
utilizar o vaso sanitário, mesmo que para fazer xixi sentado, coisas
aparentemente tão bobas, mas que para os pais são prêmios valiosíssimos e que
melhoram tremendamente a sua qualidade de vida e a dos seus filhos. As escolas
com seus valentes e dedicados profissionais preparam nossas crianças especiais,
contribuindo para torná-las seres com maior possibilidade de inclusão.
Você disse em entrevista ao Programa FM Café, da Rádio FURG, que
existem pais que depositam muita expectativa sob seus filhos. Na experiência
que teve com Leonardo, que recado você deixaria a esses pais?
Tudo o que um pai e uma mãe
deveriam projetar para um filho, seja ele especial ou normal, é a sua
felicidade. Expectativas existem e são muitas vezes frustradas, por isto a
sabedoria está em caminhar um pouco a cada dia, pondo no chão um pé de cada
vez… E vibrar com as ínfimas conquistas. E se estas não ocorrerem, agradecer
mesmo assim, por ter tido o privilégio de estar treinando, aprendendo com um
anjo.
Nos 28 anos em que Leonardo esteve na sua vida, suas noites de
sono eram interrompidas para trocar a fralda dele, por exemplo. Em algum
momento isso chegou a ser um “peso” para você?
Claro. Sou humana e falível. O
cansaço tomou o meu corpo incontáveis vezes ao longo de 28 anos. Desanimei,
chorei, esperneei, mas depois acabava rindo das situações surreais em que
estava metida por conta de ser aprendiz do meu anjo. A família toda, meu
marido, meu filho Alexandre, todos no final nos deliciávamos com as peripécias
de Leo e com a tragicomédia que era nossa vida. Importante frisar, tive também
muita sorte! Meu esposo, peça fundamental desta família, foi sempre um ombro
amigo nestas horas difíceis, uma parceria incansável e constante neste
caminhar. Sem ele talvez não tivesse conseguido o equilíbrio necessário para
andar nesta corda bamba, nas alturas em que a vida nos atirou.
Ser mãe do Leonardo foi um presente? Te tornou uma pessoa melhor?
Não tenho a menor dúvida quanto a
isto. Leonardo foi um exercício espetacular das minhas “capacidades” de amor,
de paciência e de superação dos meus limites. Sou o que sou – o que não é lá
grande coisa, mas que é bem mais do que eu tinha e era – graças a ele ser quem ele
foi. Um ser iluminado, inocente, sacana, transparente, verdadeiro, provocante,
engraçado, rabugento, gaiato, amoroso. Um anjo sedutor.
Falando da questão familiar. Ter Leonardo como filho ou irmão,
tornou a relação de vocês mais próxima?
Costumo dizer que orbitávamos em
volta de nosso sol Leonardo! Ele era o ímã que nos atraía. Nossa relação era
aquecida pela proximidade com o astro-rei. Havia vida e era em abundância.
Abundava alegria, trabalho, cansaço físico e mental, humor, cumplicidade. Um
pot-pourri maluco de sentimentos nos ligava como cola, mantendo-nos
prisioneiros, totalmente reféns deste amor iluminado. Bem-aventurados todos
nós. E agradecidos à Deus por nosso sol particular.
Que lição Leonardo deixou para você?
Meu “guru” Leonardo, sem dizer uma
só palavra, ensinou-me muito do que sei hoje. Através dele descobri ter um
manancial transbordante de paciência e de amor escondidos no fundo de mim
mesma. Por causa dele fui capaz de extrair o melhor de mim. Paradoxalmente
enquanto ele me consumia a força física, emocional, eu não me esvaziava. Notei
que quanto mais precisava me doar, mais plena me tornava. Uma constante troca
de marés… Assim era minha vida com Leo. Um renascer constante, onde a força
brotava inexplicavelmente e me fazia capaz de prosseguir, apesar dos
questionamentos e dúvidas em relação ao futuro com ele. Acho que o nome disto é
amor incondicional. Leonardo, finalmente, me mostrou que não era preciso tudo
ser ou estar perfeito para vivermos em paz, com alguma felicidade e que a sua
“diferença” foi o diferencial abençoado do nosso unido e iluminado lar.
Que mensagem você passaria para os pais que têm filhos especiais?
Filhos especiais não são um
“fardo” se os encararmos como um presente do qual podemos tirar grandes lições
para a vida. Ninguém disse que a vida com eles é fácil. Nem que não vai haver
cansaço, desalento e um turbilhão de dúvidas no meio do caminho. Caminhamos
sobre uma pedreira, muitas vezes no escuro. Mas quando há amor e verdadeira
dedicação ao ser amado, as flores brotam por entre pedras e luzes aparecem
sinalizando o nosso caminhar. Lá na frente olharás para trás e verás quanta
beleza houve no caminho. Afinal, não carregas um saco de pedras… Carregas
simplesmente um filho-desafio. E por causa dele serás uma pessoa mais leve, um
ser humano melhor. Por mais que não acredites agora, ele foi a melhor coisa que
aconteceu na tua vida. A sabedoria do tempo dirá.
Leonardo: O anjo loiro, lindo e sedutor de Denise Bondan |
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